Pai João - Ciro Costa
Lembro desse soneto quando era ainda menino, fazia o antigo ginásio. Ele apareceu num livro de português. O tempo apagou da minha memória soneto, mas por décadas persistiu na minha memória este verso “… é o urucungo a gemer na cadência do jongo”. Curiosamente, o verso persistiu por que na época fui ao dicionário para saber o que era um urucongo e um jongo. Foi esse verso que digitei no google, e o soneto me reapareceu, quase 50 anos depois!
O soneto é sobre o negro escravo, sobre a saudade da terra natal, África.
(para onde, com tristeza, o olhar curioso alongo),
sonha o negro, talvez, na solidão noturna,
com os límpidos areais das solidões do Congo.
Ouve-lhe a noite a voz nostálgica e soturna,
num suspiro de amor, num murmurejo longo,
E o rouco, surdo som zumbindo na cafurna,
é o urucungo a gemer na cadência do jongo.
Bendito sejas tu, a quem, certo, devemos
a grandeza real de tudo quanto temos!
Sonha em paz! Sê feliz! E que eu fique de joelhos,
sob o fúlgido céu, a relembrar, magoado,
que os frutos do café são glóbulos vermelhos
do sangue que escorreu do negro escravizado!
cafurna = caverna, escoderijo
urucungo = berimbau
jongo = dança de roda, de origem africana