quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Coisas que há no mar e terra do Brasil (Frei Vicente do Salvador)

Coisas que há no mar e terra do Brasil

Extraido de “Historia do Brasil”, 1627
Frei Vicente do Salvador

Nota do blogger : Frei Vicente do Salvador (1564-1636) é brasileiro de Matuim, nas proximidades de Salvador. Estudou no Colégio dos Jesuítas na Bahia e diplomou-se em teologia pela Universidade de Coimbra, Portugal. Ordenado, voltou ao Brasil por volta de 1587, onde exerceu diversas funções eclesiásticas.  Em 1627 terminou sua obra “História do Brasil”, um valioso registro sobre as coisas do Brasil na época. O manuscrito permaneceu no esquecimento, até ser descoberto pelo historiador Capistrano de Abreu na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro em 1881, dois séculos e meio depois de escrito.

Faz-se no Brasil sal não só em salinas artificiais, mas em outras naturais, como em Cabo Frio, e além do Rio Grande, onde se acha coalhado em grandes pedras muito, e muito alvo. Faz-se também muita cal, assim de pedra do mar, como da terra, e de cascas de ostras, que o gentio antigamente comia, e se acham hoje montes delas cobertos de arvoredos, donde se tira e se coze engradada entre madeira com muita facilidade.

Há tucum, que são umas folhas quase de dois palmos de comprido, donde só com a mão sem outro artifício se tira pita rijíssima, e cada folha dá uma estriga. Outra planta há chamada caraguatá, da feição da erva babosa, mas cada folha tem uma braça (1) de comprido, as quais deitadas de molho e pisadas, se desfazem em linho de que se fazem linhas, e cordas, e se pode fazer pano.

     Há árvores de sabão, porque com a casca das frutas se ensaboa a roupa, e as frutas são umas contas (2) tão redondas e negras, que parecem de pau evano torneado, e assim não há mais  que furá-las, enfiá-las, e rezar   por  elas (3).

Há muita erva de anil, e de vidro, que se não lavra. Há muitas fontes, e rios caudalosos, com que moem (4) os engenhos de açúcar, e outros por onde entra a maré, mui largos e fundos, e de boas barras e portos para os navios.

(1) Braça – antiga unidade de medida, equivalente a 2,2 mt.
(2) Contas – pequeno glóbulo, miçanga
(3) “furá-las, enfiá-las, e rezar...” – furar e enfiar as contas num fio, fazendo um rosário e rezar.
(4) “com que moem...”- o autor refere-se a rodas d´agua

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