Pero de Magalhães Gandavo
extraído de “Tratado da Terra do Brasil”, 1570
Nota do bloguista : Pero de Magalhães Gandavo era português e morou algum tempo no Brasil. De volta a Portugal, escreveu duas obras sobre o Brasil : “Tratado da Terra do Brasil” (1570) e “Historia da Provincia de Santa Cruz” (1576). Posteriormente estas obras foram unificadas em um só livro, “Historia da provincia de Santa Cruz, a que vulgarmente chamamos de Brasil”. No texto abaixo, descreve os Aymorés, e o perigo que eles representavam aos portugueses e escravos. O texto original é em português arcaico, e foi corrigido para o português atual.
Duma nação de gentes que se acha nesta capitania (de Ilhéus) :
Pelas terras desta Capitania (de ilhéus) até junto do Espirito Santo, se acha uma certa nação de gentio que veio do sertão há cinco ou seis anos, e dizem que outros indios contrários destes, vieram sobre eles às suas terras, e os destruiram todos, e os que fugiram são estes que andam pela Costa.
Chamam-se Aymorés, a língua deles é diferente dos outros indios, ninguém os entende, são eles tão altos e tão largos de corpo que quase parecem gigantes; são muito alvos, não têm parecer dos outros indios na terra nem têm casas nem povoações onde morem, vivem entre os matos como brutos anaimais; são muito forçosos em extremo, trazem uns arcos muito compridos e grossos conforme a suas forças e as flechas da mesma maneira. Estes indios têm feito muito dano aos moradores depois que vieram a esta Costa e mortos alguns portugueses e escravos, porque são inimigos de toda gente. Não pelejam em campo nem têm animo para isso, põem-se entre o mato junto dalgum caminho e tanto que passa alguem atiram-lhe ao coração ou a parte onde o matem e não despedem flecha que não na empreguem. Finalmente, que não têm rosto direito a ninguem, senão a traição fazem a sua. As mulheres trazem uns paus tostados com que pelejam. Estes indios não vivem senão pela flecha, seu mantimento é caça, bichos e carne humana, fazem fogo debaixo do chão por não serem sentidos nem saberem onde andam.
Muitas terras viçosas estão perdidas junto desta Capitania as quais não são possuídas dos portugueses por causa destes indios. Não se pode achar remédio para os destruirem porque não têm morada certa, nem saem nunca de dentro do mato: E assim quando cuidamos que vão fugindo ante quem os perseguem, então ficam atras escondidos e atiram aos que passam descuidados. Desta maneira matam alguma gente. Todos quantos indios há no Brasil são seus inimigos e temem-os muito, porque é gente traiçoeira. E assim onde os há nenhum morador vai a sua fazenda por terra, que não leve quinze, vinte escravos consigo, de arcos e flechas. Estes Aymorés são muito ferozes e cruéis, não se pode com palavras encarecer a dureza desta gente. Não andam todos juntos, derramam-se por muitas partes, e quando se querem ajuntar assobiam como pássaros ou como bugios de maneira que uns aos outros se entendem e se conhecem Tambem os portugueses matam alguns deles, e têm muitos destruídos, principalmente nesta Capitania dos Ilhéus, e guardam-se muito deles, porque já sabem suas manhas e conhecem muito bem sua malicia.
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