Guerra sem testemunhas - Osman da Costa Lins
Havendo chegado aos quarenta anos e tendo a essa altura, vários livros publicados, sentia-me em condições de dar um depoimento sobre o ofício de escrever. Como sabe, um livro não é escrito no vazio sem uma finalidade. Eu me sentia, em face da minha experiência com as letras e com outras coisas relacionadas com a literatura, em condições de transmitir a outras pessoas que se interessam ou virão a interessar-se pela literatura, certos aspectos poucos conhecidos, e, todavia, importantes da vida normal do escritor: suas lutas, as dificuldades com o texto, os conflitos com os editores, etc.
Queria também que as pessoas não preocupadas com a literatura, as que apenas leem de vez por outra um livro, sem dar-lhe a maior atenção, pudessem tomar conhecimento do que é, na realidade,a vida de um escritor. Do que significa seu trabalho silencioso. Até certo ponto é um livro confessional mas também é um livro de combate e mesmo – não no sentido religioso – de pregação. Uma espécie de exame e defesa, até certo ponto apaixonada, dos livros e da literatura. Acrescento que não é só isso.
Veja: ao escrevê-lo, como disse, estou com vários livros publicados. Tenho portando, experiência bastante para conceber e levar a termo o livro. Ao mesmo tempo minha obra está ainda em curso. Assim, poderei também, eu próprio, tirar proveito do livro que escrevi. Por esta razão, constitui igualmente uma meditação sobre o escritor e a literatura. Após escrevê-lo, as letras se haviam tornadas mais claras para mim do que eram antes. Também minha vida, como homem e como escritor, parece-me mais definida.
Por que o titulo “Guerra sem testemunhas” ? Guerra por que a vida do escritor é realmente uma guerra em muitas frentes. Isto, bem entendido, quando se é escritor. Pois nem sempre o homem que escreve e tem livros publicados é um escritor. A literatura, como qualquer outra atividade, tem também seus macacos. Aqueles que, imitando os mesmos gestos de escritor, não são nem nunca serão escritores. Mas quando se é verdadeiramente um escritor, quando se assume em definitivo e com todas as consequências esse encargo, a luta não cessa. O escritor é um homem em guerra consigo próprio, com as palavras, com as correntes literárias triunfantes, com o editor, com a estrutura social, etc. Esta guerra, no entanto, bem poucos conhecem : ela é sem testemunhas. Eu lembraria a Saint-Exupêry, que exclama durante propósito de uma alusão de Sartre a uma missão perigosa : “Eu sou a minha testemunha!”. Acrescenta o filósofo que a angustia, o desanimo e os suores de sangue começam quando não podemos ter outra testemunha, senão nós próprios. E então, conclui, que experimentamos até o fim nossa condição de homens.
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