quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

O culto às tradições

 

Extraído de “Idéias e comentários”, 1921
Mário Franzen de Lima

Nota do blogger : de alguma forma, o Brasil, pelo menos em termos de cultura popular, é uma colônia americana. Os americanos criaram (e continuam criando) um vasto patrimônio de entretenimento, e conseguiram vender, alastrar sua cultura popular pelo Brasil. Assim, crescemos e consumimos cultura americana : super heróis de ceroulas, Michael Jackson, filmes, seriados de Tv; cultuamos atrizes e atores do cinema americano, dos seriados da Tv, etc. Até tentaram fazer a gente gostar de basquete, empurrar a NBA, mas o futebol falou mais alto. As livrarias oferecem mais literatura estrangeira que nacional. Os colonizadores americanos tomaram de assalto e ocuparam até as nossas entranhas, nossos estômagos : McDonalds, Burger King, KFC, Kellogs, Coca Cola e vai por aí a fora. Noutro dia, fui num restaurante japones, e me serviram sushi com cheese cake. Pronto, pensei, agora os americanos invadiram o Japão. Economicamente, acontece o mesmo fenômeno, consumimos carros e alimentos de multinacionais americanas. Para completar o colonialismo, fazemos compras no Wall Mart.

Mas, com o mundo globalizado, facilidades de transportes e comunicação (leia-se www), por que não desfrutar e usufluir o que o mundo tem de bom e divertido, indiferente da sua origem ? Não somos e não queremos ser uma Cuba, culturamente ilhada,  isolada.   Franzen de Lima, se estivesse ainda vivo, estaria à beira da loucura.

O culto das tradições é, seguramente, uma das provas mais decisivas da vitalidade de um povo.

Orgulhar-se do seu passado; haurir-lhe os ensinamentos por via da imitação do exemplo dos grandes vultos representativos da raça; venerar a memória dos que, por seu valor intelectual, pela sua eminência moral ou pelos serviços prestados à causa pública, fizeram jus a consideração da posteridade; zelar carinhosamente pela conservação de práticas e usanças, que se achem por assim dizer impregnadas da alma nacional; repelir eivas estranhas que possam turbar a limpidez da corrente, que represente a continuidade histórica da nação, - eis, para um povo, outros tantos meios de firmar, no conceito dos demais, a originalidade de sua existência, a feição típica de sua vocação.

Sem a diferenciação característica, conseguida por via de bem entendido nacionalismo, a idéia de pátria reduz-se a mera ficção.

A tendência para o cosmopolitismo é indício de inferioridade, por falta de energia para fixar qualidades próprias.

Sem apego a tradições nacionais, qualquer povo não deixará de ser uma coletividade parasitária, uma cópia, um reflexo apenas de outros povos, sem autonomia espiritual, sem alma definida, a despeito da soberania política que desfrute.

Individualizar-se, adquirir feitio peculiar, manter os traços diferenciais, aperfeiçoando-os e revigorando-os, sem dar brecha à dissolvente ação das mesclas desnacionalizadoras, - deve ser o ideal dos povos que pretendem um lugar no futuro.

É verdade que povo algum pode forrar-se, em absoluto, às influencias dos demais, insulando-se num retraimento que, dada a possibilidade deste, entravaria, por completo, o seu progresso.

Um dos característicos da civilização moderna é, precisamente, no domínio econômico, assim como no domínio moral e das ideias, o intercâmbio, a permuta.

O necessário é que esse cambio espiritual não afete profundamente o caráter do povo importador e que as ideias ou costumes aproveitados o sejam mediante adaptação esclarecida e consciente e não por meio de pastiche ou cópia servil.

Fora desses casos restritos, impostos pelas exigências do convívio internacional, cada povo deve prezar os seus costumes e as suas tradições, mante-los com orgulho, passá-los de geração em geração, como patrimônio que encerra a própria alma nacional.

Deixar de fazê-lo é cair voluntariamente no regime do colonato.

É perder a consciência de si mesmo. É anular-se de uma vez.

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