quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Folhetos (Literatura de cordel)–história

 

Literatura de cordel (folhetos)


A literatura de folhetos (ou de cordel) no Brasil é um gênero literário caracterizado por métrica (nem sempre perfeita), rimas e linguagem coloquial, popular; e estilo muito regionalista. Em geral são escritos na primeira pessoa, de maneira bem simples, usando vocabulário pobre. Os autores, quase todos, não tiveram bom nível de educação escolar, o que não impediram de escrever alguns bons textos. Segue abaixo um exemplo de cordel:

As Proezas de João Grilo - João Martins de Athayde
 

João Grilo foi um cristão
que nasceu antes do dia
criou-se sem formosura
mas tinha sabedoria
e morreu depois da hora
pelas artes que fazia.

E nasceu de sete meses
chorou no bucho da mãe
quando ela pegou um gato
ele gritou: não me arranhe
não jogue neste animal
que talvez você não ganhe.

( . . . )
Porém João Grilo criou-se
pequeno, magro e sambudo
as pernas tortas e finas
e boca grande e beiçudo
no sítio onde morava
dava notícia de tudo.
 

O humor também é quase sempre presente no cordel. É típico da Região Nordeste, onde surgiu trazida de Portugal no final do século XIX. Até aos dias de hoje este tipo de literatura ainda é produzida em sua maioria por autores nordestinos.
Os paraibanos Leandro Gomes de Barros (1865-1918) e Silvino Pirauá de Lima (1848-1913) foram os poetas iniciadores deste gênero no Brasil, e também serviram de modelo para os que vieram depois. 

A literatura de cordel marginalizada


A literatura de folheto/cordel é quase uma manifestação folclórica, e foi sempre ignorada, relegada a segundo plano pelos estudiosos da Lingua Portuguesa, devido a sua simplicidade, suas rimas pobres e forçadas, seu vocabulário pobre. Sempre foi considerada sub-literatura. Mas os cordelistas também fazem pouco caso dos eruditos, como escreveu o cordelista Pacifico Pacato Cordeiro Manso :
Quem censura os meus livrinhos
Não passa de um caradura
Por que eu mesmo confesso
Não ter a Literatura
Pois se tivesse estudado
Seria hoje um letrado
Faria grande figura

Sou o menor dos poetas
Mas digo por onde passo
Bem quisera minha gente
Fazer versos como eu faço
Mesmo sem Literatura
Não temo um caradura
Nem que ele seja de aço
.
A literatura de folhetos por tradição sempre foi feita em pequenas brochuras, no formato de caderneta, ao estilo Almanaque Biotônico Fontoura, em tamanho pouco menor que meia folha de papel sulfite A4. A elaboração dos livretos eram quase artesanais, em produções econômicas, em geral impressos em folha de papel jornal. A partir da década de 60 os folhetos ganharam o apelido de “cordel”, devido ao fato de serem expostos pelos vendedores pendurados em cordões, usando-se pregadores de roupas.

(fonte : convivendocomaseca.blogspot.com.br)

A literatura de folheto/cordel teve seu auge entre os anos 1930 a 1960. No seu período mais áureo, na década de 40, uma tipografia chegou a tirar 12.000 exemplares por dia. A partir dos anos 70, com a chegada da Tv e a popularização do rádio e do cinema, o folheto começou a cair em declínio. Lido principalmente entre as classes menos abastadas, a inflação e a queda do poder aquisitivo fez com que os gastos com folhetos ficassem em segundo plano. Porem ultimamente tem se recuperado, embora de maneira ainda discreta.

Literatura de cordel e xilogravuras

Os primeiros livretos de folheto/cordel eram ilustrados com xilogravuras (impressão cuja matriz é feita em madeira escavada). A produção de gravura em clichê metálico era muito caro, e por isso, recorriam aos moldes em madeira. Algumas dessas xilogravuras são verdadeiras obras de arte. O maior artista de xilogravuras de cordel foi J. Borges. As xilogravuras da literatura de cordel estão sendo redescobertas hoje, principalmente pelos artistas plásticos.



Infelizmente, por força da modernização dos processos de impressão, que melhoraram muito a partir da década de 80, as xilografias foram desaparecendo, dando lugar a ilustrações multicoloridas.


encontro-de-lampiao-com-adao-no-paraiso-luzeiro

Literatura de cordel - Temas  

Os autores de folhetos (também conhecidos por cordelistas) se inspiram nos mais variados temas. Se na literatura mais formal os temas e assuntos são mais sérios e palpáveis, no cordel vale tudo. Os cordelistas se inspiram em situações incríveis e tem preferencia nos seguintes temas : 
- Histórias de amor, sempre com inicio conturbado e final feliz;
- Histórias do cangaço, quase sempre envolvendo Lampião;
- Histórias com fundo moral;
- O sofrimento do sertanejo com a seca;
- Encontros de duas personalidades famosas no céu ou no inferno
- Histórias exdrúxulas, estranhas, inusitadas
São criativos, inventam histórias incríveis, inimagináveis, por exemplo: - Princesa grega, chamada Creuza,  é raptada por um helicóptero pilotado por um nordestino que foi parar na Turquia;
- Mulher que batia na mãe sofre castigo divino e se transforma em cadela;
- Rapaz se casa com mulher que se transforma em porca nas noites de lua cheia,
- Satanás desembarca na Terra, após viagem em disco voador;
- Rapaz apanha das moças por que não sabe namorar,
- O cavalo que defecava dinheiro;
- A mulher enciumada que engoliu um par de tamancos,
- Bin Laden na Bahia


Muitos cordelistas gostam de contar histórias de reis opulentos e sua (sempre) formosa princesa, de reinos distantes. Ou de fazendeiros, usineiros ou outros milionários. Quase sempre as filhas desses milionários e as princesas acabam se envolvendo com um pobre plebeu, um “desqualificado”. O final, é claro, é sempre feliz.


Literatura de cordel - Encontros 


Os cordelistas gostam de promover encontros dos mais esdrúxulos, envolvendo personagens antagônicos, sempre com pitadas de bom humor. Lampião, o cangaceiro, é o preferido de todos cordelistas, veja alguns títulos : 
A Chegada de Lampião no Céu (Lampião se encontra com São Pedro)
A chegada de Lampião no inferno (encontro com o Diabo)
O encontro de Lampião com a negra de um peito só
Alien e o Predador contra Lampião
Encontro de Lampião com Adão no paraíso
Visita de Lampião ao Padre Cicero no céu.
Lampião e Lancelote
(Lancelot, um dos Cavalheiros da Távola Redonda)
O encontro de Lampião com Dioguinho (outro cangaceiro)
A Luta de Zé do Caixão com o Diabo
Historia de Zeca Pagodinho, disco voador e  extraterrestre
Encontro de Raul Seixas com Zé Limeira
O encontro de Lampião com Kung Fu em Juazeiro do Norte
Debate do Papa de Roma com Roberto Carlos


Esses encontros sempre acabam em  brigas, rixas, pelejas entre as duas pessoas. As vezes, uma representando o bem e a outra o mau.
Alguns cordelistas aproveitaram-se de "ganchos", um fato novo de grande presença na mídia para produzir e vender os seus cordéis :

Literatura de cordel - Galeria de capas 


As capas dos cordéis a seguir retratam bem as características desta arte : satírica, humoresca, fantástica e criativa.







Nenhum comentário: